Lei, graça e a guarda do sábado

Existe um grande conflito e que hoje está muito acentuado. Esse conflito consiste em conhecer a verdadeira vontade de Deus. Daí a importância de saber se cumprir todos os mandamentos é realmente necessário, ou se só acreditar no sacrifício de Jesus é suficiente.

Esse conflito nasce com a incapacidade do homem de chegar a Deus pelo próprio intelecto. A Teologia é importante, a Filosofia dá referências, a Ciência, em amplo sentido, pode também contribuir para a compreensão de muitas questões insertas nas Escrituras. Porém, é importante nos achegarmos a Deus com o coração aberto, humilde e disposto a aceitar a verdade, mesmo que ela contrarie nossas tendências e conveniências.

Acho que o exemplo de Abraão é suficiente para elucidar e afastar a aparente oposição estabelecida entre a lei e a graça. Abraão, muito antes de ser pai, acreditou em Deus e em Sua promessa de que seria pai de muitas nações. Esta fé lhe foi imputada por justiça, ou seja, Abraão foi justificado pela fé.

As obras não salvam. Isso é correto. Mas será pelas más obras que os ímpios serão condenados. Você pode procurar e irá encontrar inúmeras advertências relacionando as más obras (ou descumprimento das leis) ao juízo. Juízo, você sabe, é a execução de uma sentença, a condenação, a morte eterna. Os santos não entrarão em juízo, por isso os termos: salvos, salvação, remidos, etc. Salvação de quê? Do juízo, é claro. Da morte eterna, evidentemente, e do pecado.

Voltando a Abraão, notamos que Deus lhe prometera uma descendência como o número das estrelas, mas quando lhe dá um filho, Isaque, o pede em sacrifício. Foi uma ordem direta e clara (como dizem os militares) a Abraão. Abraão já havia cumprido tal ordem em seu coração, pois se dispôs a executá-la. Abraão sacrificaria Isaque se fosse realmente esta a vontade de Deus. Ele sabia que o Criador honraria Sua promessa, qualquer que fosse a circunstância. Abraão cumpriu a lei em seu coração, pois intentou sacrificar seu filho ao Senhor. Isto é OBRA, OBEDIÊNCIA!

A fé sem obras é morta (Tiago 2:26). Todo crente diz e repete isso o tempo todo, principalmente quando fala em caridade, esmolas, visitas a doentes e presos, etc. Mentalmente, muitos se indispõem em estender o conceito de obras ao cumprimento da lei, dos mandamentos, embora este seja o completo sentido da palavra “obras”. Caridade, auxílio, visitas, não matar, não adulterar, guardar o Sábado, não se curvar a outros ídolos, etc.

Grifei o “guardar o Sábado” porque as outras questões, a meu ver, estão de certa forma pacificadas. O Sábado é a grande questão. Existem outras, eu sei. A questão dos alimentos puros e impuros é uma delas. Mas a disposição para reconhecer a vigência de um mandamento é a mesma para reconhecer a vigência do outro, e o inverso também é verdadeiro.

A quem muito for dado, muito será cobrado (ver Lucas 12:47, 48). Imagino que depois de Satanás e seus anjos, os que mais sentirão o peso da glória de Deus em confronto com a própria pecaminosidade serão os TEÓLOGOS que não cumprem a lei (não a civil dos judeus, nem o cerimonialismo). Ai do Teólogo que estuda a Palavra de Deus para satisfazer sua própria vaidade, diz conhecer as Escrituras e delas tira conclusões que não revelam a verdadeira vontade de Deus. Dessa maneira eles (teólogos anti-lei) se tornam verdadeiras pedras de tropeço, cuja repulsa Jesus deixou bem clara no evangelho (Mateus 7:21-23).

A verdade que envolve a lei e a graça é muito simples. Mas Deus só a revela ao coração que se dispõe a recebê-la. Ele a oculta dos sábios e entendidos, porque estes, em sua maioria, são soberbos, e Deus resiste aos soberbos! (Tiago 4:6; 1 Pedro 5:5).

Jesus já acenava para tal questão em Seu ministério, pois sabia que Satanás, pai da mentira (João 8:44 – nela incluída a meia-verdade), iria utilizar o próprio processo de salvação para enganar o homem mais uma vez e arrastá-lo para longe do Senhor. Afirmou Jesus que a árvore que não der frutos será cortada e lançada ao fogo (Mateus 7:19, 20). Paulo afirma que os frutos da carne são (não taxativo): prostituição (não adulterarás, etc), homicídios (não matarás), idolatria (não terás outros deuses diante de mim), “e coisas semelhantes a estas” (Gálatas 5:21).

Seria coincidência o fato de a maioria dos frutos da carne mencionados por Paulo consistirem no descumprimento dos 10 mandamentos?

Jesus diz que não é possível uma árvore dar frutos bons e ruins. Diz também que uma árvore boa não dá frutos maus, nem a árvore má, frutos bons (Mateus 7:17, 18).

Jesus cumpriu efetivamente todas as leis (até as civis). Mas Seu êxito não se deve à Sua natureza divina, no fato de, mesmo sendo homem, foi ungido pelo Espírito Santo, porque orava constantemente, porque jejuava, porque estava em comunhão com o Pai, ininterruptamente.

Isso prova que a nós também é possível observar os mandamentos pela graça de Deus, é claro (Filipenses 2:13). Sozinhos não conseguimos nem amar a nós mesmos. Claro que pecaremos (pois a natureza pecaminosa continua dentro de nós e precisa ser morta todos os dias), mas não porque os mandamentos são pesados (1 João 5:3) ou impossíveis de se observar quando estamos totalmente ligados a Deus. Quem diz isso é Lúcifer, o tempo todo, desde antes da fundação do mundo. Ele é quem acusa as leis de Deus de irrazoáveis; é ele quem acusa Deus de tirano.

É comum ouvir do crente a repetição de alguns textos bíblicos como: “Nada é impossível ao que crê”. “Tudo posso naquele que me fortalece”. Mas, em sinceridade, você já ouviu algum crente dizer isso sob a perspectiva de cumprir a lei, os mandamentos?

Para nos socorrer em nossas ânsias materiais e seculares, em nossos medos e apuros, clamamos a Deus e sem o menor constrangimento cobramos-Lhe o cumprimento de Suas promessas. Mas para nos ajudar a cumprir a lei, já ouviu alguém dizer a Deus: “Ó Senhor, tu disseste que ao que crê tudo é possível, e eu creio, e eu quero que o Senhor me ajude a cumprir a lei”?

Se pecamos, não é porque não podemos cumprir a Lei com a ajuda de Jesus, pois podemos sim (o Espírito de Deus efetua em nós “tanto o querer quanto o realizar” – Filipenses 2:13). Desobedecemos porque somos naturalmente maus, inclinados às coisas deste mundo. Veja o que está escrito em 1 Coríntios 10:13: “Não vos sobreveio tentação que não fosse humana; mas Deus é fiel e não permitirá que sejais tentados além das vossas forças; pelo contrário, juntamente com a tentação, vos proverá livramento, de sorte que a possais suportar.” O problema não está na Lei de Deus, mas em nós!

Vejo a graça como esta oportunidade a mais que o Senhor nos dá, a cada momento, de interrompermos a conduta pecaminosa e agirmos segundo Sua vontade.

Assim, é claro que todos pecamos, mas não vivemos no pecado. Há uma diferença substancial aí. Lutamos contra o pecado. Isso é a busca pela santificação, sem a qual ninguém verá a Deus (Hebreus 12:14).

Tudo é bem simples. As obras não salvam: são consequência natural da fé (ver Efésios 2:8-10). Guardar o Sábado não é legalismo, é reconhecer que Deus o santificou ainda antes da entrada do pecado (Gênesis 2:1-3). É reconhecer que nosso Criador e Pai sabia de antemão das nossas necessidades de descansar fisicamente, mediante a abstenção de quaisquer obras, e espiritualmente, entrando em Seu descanso quando dedicamos um período que ELE DETERMINOU – a Ele e à comunhão contínua com Ele (Êxodo 20:8-11).

Jesus afirmou categoricamente que não veio revogar a lei, e sim cumpri-la (Mateus 5:17-19). Quem afirma que Jesus revogou a lei advoga a tese acariciada por muitos de que Jesus foi cínico, populista e político naquele momento. Ora, Jesus jamais utilizou meias-palavras. Jesus não revogou o Sábado. Muitas, inúmeras obras foram realizadas por Jesus em pleno Sábado, e muitos se apegam a isto para dizer que Jesus revogou a observância do sétimo dia. Ora, que eu saiba, Jesus não era um assalariado nem um empresário. Só vivia para cumprir o Seu ministério. Jesus não estava trabalhando no Sábado, estava sinalizando, dizendo ao homem, EU SOU O CORDEIRO DE DEUS, Eu sou o “EU SOU” do antigo Testamento (João 8:58, 59; compare com Êxodo 3:14), o DEUS ETERNO, e estava no templo todos os sábados. É preciso entender que a natureza da obra que Jesus realizava aos sábados não é a mesma natureza das obras terminantemente proibidas pelo Senhor de serem realizadas no dia santo.

O Senhor sabe que temos nossos afazeres, nossas ansiedades, e Ele quer que lancemos sobre ele toda a nossa fadiga, carnal e espiritual, e que descansemos nossa mente e coração num dia reservado só pra Ele, no momento em que ELE DETERMINOU, não nós: NO  SÁBADO (Marcos 2:27, 28).

Existem muitas conjeturas e muitos argumentos sedutores para desabonar a guarda do Sábado. Você com certeza os encontrará. Mas nenhum deles, você vai sentir, irá destruir o discernimento dado pelo Espírito de Deus.

Disse Jesus que até do Sábado o Filho do homem é Senhor (Mateus 12:8). Ele não diria isso se o Sábado tivesse de perder a santificação dada por Deus, afinal, para quê ser Senhor de algo sem importância?

Veio-me agora uma coisa à mente: os mandamentos de Deus foram escritos por Suas próprias mãos (Êxodo 31:18). Eles são o que Mauro Fernando Meister chama de “Leis Morais”… Hoje ninguém discute a vigência dos mandamentos: não matar, não adulterar, não roubar, não cobiçar, honrar pai e mãe, não dirás falso testemunho… Porque estes mandamentos regulam a vida entre os homens. Mas note: os mandamentos que regulam a relação dos homens com Deus[2] estão a cada dia mais fragilizados sob a rubrica do legalismo:

Não terás outros deuses diante de mim: Hoje um programa de televisão, um jogo de futebol, a profissão, o automóvel, o status social (principalmente o intra-igreja), entre outros tantos, podem muito bem se constituir em deuses que se interponham entre nós e o Senhor. Mas é tudo muito “discutível”. A transigência com este preceito precede o descumprimento do mandamento seguinte.

Não farás para ti imagem de escultura… e não te encurvarás a elas nem as servirás…:

A transgressão deste mandamento não é prerrogativa dos católicos e dos umbandistas. Muitos ídolos e imagens, se não levantados por nós, nos são apresentados diariamente: a perversão sexual, luxúria, glutonarias, etc. Essas coisas estão aí, e nos curvamos a elas quando não as resistimos. Mas isto também é muito “discutível”.

Não tomarás o nome do Senhor teu Deus em vão: Muitos querem mostrar ao mundo que pertencem a um “grupo de elite”: “os salvos”, e fazem questão de usar camisetas e adesivos com slogan do tipo: PROPRIEDADE EXCLUSIVA DE JESUS. E a vida desses crentes, em muitos casos, não encontra correspondência em seus dizeres. Isto não é usar o nome do Senhor em vão? É “discutível” também?

Lembra-te do dia do Sábado, para o santificar: Não há um único verso em toda a Bíblia que ordene a guarda do domingo, mas muitos teólogos insistem em tirar conclusões a partir de textos que não autorizam esse método de interpretação.

Por fim, deixo-lhe um verso para meditação: Tiago 2:14-26.

“Verificais que uma pessoa é justificada por obras e não por fé somente.” (Tiago 2:24)

 

 

[1] Esta resposta foi elaborada pelo Advogado Fernando Albuquerque, residente do estado de Minas Gerais. O material foi direcionado a um colega dele, jurista, em resposta a um artigo enviado contra a validade da Lei. Gentilmente ele nos cedeu sua resposta, na qual fizemos pequenas adaptações para o público da Escola Bíblica. Utilizado com permissão do autor.

[2] Você poderá ler os Dez Mandamentos em Êxodo 20:1-17 ou em Deuteronômio 5:6-21.